Cada vez mais atletas entregam performances excepcionais mesmo sendo mais experientes. Preparação física, bagagem pessoal e esforço individual podem ser a chave do sucesso. Entenda

Por Enzo Marcus, Isabela Moro e Luigi Tocchet

No dia 11 de março, LeBron James, de 37 anos, tornou-se o primeiro dos atletas acima de 35 anos na história da NBA a marcar 50 pontos em ao menos dois jogos de uma mesma temporada. Menos de 24 horas depois, Cristiano Ronaldo conseguiu a incrível façanha de marcar 3 gols em uma mesma partida, no auge de seus 37 anos. Três dias mais tarde, Tom Brady, o maior jogador de futebol americano de todos os tempos, anunciou sua volta da aposentadoria aos 44 anos.

Esses são apenas exemplos recentes de atuações em alto nível de atletas cuja idade já está avançada. No Brasil, também não é incomum vermos profissionais mais experientes realizarem performances atléticas impressionantes, como o goleiro Fábio, a jogadora de vôlei Carol Gattaz, o piloto Rubens Barrichello, entre tantos outros. Apesar das maiores idades, seus desempenhos ainda são excelentes, graças a muito mais que talento. E o Portal Quentaro foi atrás de descobrir os motivos.

Tom Brady e Cristiano Ronaldo se encontraram em jogo do Manchester United na mesma semana do retorno da aposentadoria do estadunidense e do hat-trick do português (Imagem: Tom Brady/Twitter).

Preparação física de atletas mais experientes

É inegável o papel fundamental do trabalho muscular. Em entrevista exclusiva ao Portal Quentaro, o preparador físico Walmir Cruz – que já trabalhou com Ronaldo Fenômeno, Roberto Carlos, Rivaldo, etc. – explicou que os atletas de mais idade ganham acompanhamento médico individual e treinam muitas vezes separadamente, a fim de evitar lesões. Os dados físicos e processuais de jogo são coletados para serem usados como base no trabalho. É importante reconhecer quando um jogador está no seu limite físico, para a manutenção da saúde do esportista.

Fazemos as avaliações dos atletas para saber em quais condições eles se encontram. Não são só avaliações físicas. Vemos o peso, altura, massa muscular… Existe uma avaliação chamada SMS em que você realmente avalia o corpo do atleta, se ele tem alguma pendência para algum lado, se ele tem um lado mais forte que o outro”, disse Walmir.

Para garantir uma excelente performance, é preciso superar obstáculos referentes ao corpo, o que nem o melhor preparador consegue fazer sempre, a exemplo do calendário comprido e cansativo do futebol brasileiro. “Essa questão do calendário é uma que eu já venho batendo há mais de 20 anos. Você não tem o tempo necessário para se preparar para os campeonatos longos durante toda a temporada […] O atleta que não treina adequadamente dificilmente vai ter uma performance boa. É preciso saber lidar, minimizar os problemas”, afirmou o preparador físico.

Walmir Cruz integra a comissão de Fábio Carille, com quem conquistou o Campeonato Brasileiro de 2017 e o Campeonato Paulista de 2017, 2018 e 2019, superando o extenso calendário (Imagem: Walmir Cruz/Instagram).

Quanto ao pouco tempo de recuperação, o lateral direito do AC Oulu Rafael Scapini – ou Rafinha, como é conhecido na Finlândia –, de 39 anos, fez questão de reafirmar a problemática brasileira. Durante conversa especial com o Portal Quentaro, ele criticou a agenda de jogos em nosso país: “Eu nem acho que os métodos de treino [no Brasil] são tão diferentes assim [dos treinos na Europa], acho que a grande diferença é o calendário. Na Europa, normalmente se joga bem menos e o período de férias é respeitado”. Para ele, atletas mais experientes em geral precisam de mais descanso após atividades de alto desempenho, o que não é possível com o excesso de partidas.

Outro desafio a ser superado por preparadores que querem garantir uma maior longevidade atlética são as atividades praticadas pelos esportistas. Nesse sentido, atletas que realizam práticas de menor impacto corporal, como goleiros, pilotos e golfistas, tendem a render por mais tempo. “Essa questão de um atleta correr 6, 7 quilômetros por treino… O desgaste articular é muito alto”, justificou Walmir Cruz.

Rafael Scarpini, ou Rafinha, enquanto ainda jogava pelo Helsinki, onde ficou de 2016 a 2019 (Imagem: Juha Tamminen).

A bagagem pessoal dos atletas experientes

Se a ausência de lesões permite a prática, é a experiência que diferencia os atletas mais velhos dos mais jovens. Para analisar o bom desempenho, é necessário considerar a psicologia dos competidores. Segundo o livro “Treinamento Desportivo – estruturação e periodização”, de Antonio Carlos Gomes, doutor em ciência do treinamento desportivo de alto rendimento pela Universidade Nacional de Educação Física e Desportos de Moscou: “Atletas experientes demonstram frequentemente uma surpreendente capacidade de prever as ações do adversário e reagem oportunamente a elas”.

O texto ainda defende a importância dos treinamentos que estimulem as capacidades cognitivas de jogadores de idades avançadas. Com práticas que os mantêm em alerta e ativos mentalmente, os atletas não sofrem tanto com a velocidade dos esportes modernos. Além disso, o aspecto do autoconhecimento é fator determinante para o bom desempenho. Rafinha, jogador citado anteriormente, confirmou: “Com o tempo, eu conheço mais o meu corpo e o meu limite”. 

Quanto a essa bagagem, é interessante que os experientes a utilizem como forma de mentoria aos mais novos. Dessa forma, erros de jovens são trabalhados desde as raízes, o que é parte de um plano qualitativo de longo prazo. “Os caras [jogadores recém vindos da base] ficam marrentos por terem uma ascensão muito rápida. Já esses caras que são ídolos internacionais, é extremamente fácil com eles, porque são profissionais”, comentou o preparador Walmir.

Arte feita pelo Los Angeles Lakers, time de LeBron, para informar que o camisa 6 é o atual líder de pontos por jogo da NBA (Imagem: Lakers/Twitter).

Esforço individual de atletas mais experientes

Quanto mais avançada a idade, maior a dedicação envolvida para garantir a integridade física. Para Walmir, é nítido como atletas mais experientes lidam melhor com os exercícios propostos. Isso talvez reflita um traço de maior comprometimento deles, mesmo que só estejam tentando “curtir o futebol” no final de carreira, como é o caso de Rafinha.

Esse comprometimento se relaciona a fatores cruciais para a longevidade que estão sob controle único e exclusivo do próprio jogador. Saber “quando descansar, quando precisa descansar mais que o normal, quando tem que ficar em casa… Se alimentar bem, dormir bem”, como dito por Rafinha, são coisas importantes para o alto desempenho e que somente você consegue dizer sobre seu corpo.

Sobre a dedicação pessoal, vale citar medidas tomadas pelos atletas que serviram de introdução para esta reportagem. LeBron James aproveita seu alto poder aquisitivo para gastar mais de 1 milhão de dólares por temporada em sua preparação física individual. Já Tom Brady criou seu método próprio de treinamento – chamado TB12 – e segue uma rígida dieta, que exclui coisas surpreendentes, como morangos. Por fim, Cristiano Ronaldo possui um regime peculiar de sono que lhe rende uma melhora em seu desempenho: dorme cinco vezes ao dia em ciclos de 90 minutos.

Porém, tudo isso são apenas acompanhamentos para o ingrediente principal: o talento. Sem ele, seria impossível manter o alto nível por tanto tempo. É pela qualidade individual que esses atletas experientes seguem a dar shows dentro de quadras, campos, piscinas, pistas, entre outros. Para nós, meros espectadores, só nos resta admirar e torcer para que a longevidade vire uma tendência.

Tom Brady promovendo seu livro “TB12 Method Book“, no qual explica sua metodologia pessoal de evitar lesões e prolongar o potencial do atleta, em 2012 (Imagem: TB12Sports/Instagram).

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